Armas biológicas? Os EUA devem uma explicação
Urbano de Campos / Global Times — 16 Março 2022
As forças russas na Ucrânia reuniram provas documentais sobre laboratórios de investigação em agentes biológicos financiados e geridos conjuntamente pelo Departamento da Defesa dos EUA e as autoridades ucranianas. São cerca de 30 as instalações existentes na Ucrânia, algumas geridas em exclusivo pelos EUA. Mais umas centenas delas estão espalhadas por várias partes do mundo. A denúncia feita pelos russos colocou os EUA em má posição: primeiro negaram o assunto, depois tentaram virar o bico ao prego acusando os russos de estarem a arranjar pretextos para o uso de armas químicas no conflito ucraniano. Os argumentos norte-americanos não convencem ninguém minimamente informado — quem tem de dar explicações ao mundo sobre o caso são eles e não a Rússia.
Uma rede imensa de laboratórios deste tipo foi montada pelos EUA em todo o mundo desde 1990, após o fim da URSS, estendendo-se às repúblicas ex-soviéticas da Ásia Central. Segundo entendidos no assunto, também terá contado para esta decisão de externalizar a investigação o receio de que uma eventual fuga de agentes patogénicos atingisse o território dos EUA — o que diz bastante sobre a natureza da investigação.
No dia 25 de fevereiro, um dia depois de as tropas russas entrarem na Ucrânia, o site oficial da embaixada dos EUA retirou todas as referências aos ditos laboratórios e removeu-as da internet, como denunciou a Global Research em 2 de março levantando uma legítima suspeita: se as actividades dos laboratórios eram absolutamente legais e com propósitos pacíficos, que razão haveria para as esconder?
A 10 de março, o ministério da Defesa russo divulgou a documentação recolhida. Disse: “O Pentágono sabia que, se estes documentos caíssem nas mãos dos peritos russos, seria muito provável que a Ucrânia e os EUA fossem acusados de terem violado a Convenção sobre Proibição de Armas Químicas e Biológicas”. E acrescentou: os documentos encontrados “provam que o ministério da Saúde da Ucrânia deu ordens para a completa destruição dos bio-agentes existentes nos laboratórios”.
O coro que, da banda dos EUA e aliados, imediatamente se levantou a designar a denúncia como propaganda russa, procura evitar que a opinião pública conheça os factos. Mas o assunto é demasiado sério para ser descartado dessa maneira simples. É o que considera o editorial do site chinês Global Times (11 de março), sublinhando que os EUA devem uma resposta ao mundo. Ouvir o outro lado é uma forma de romper o bloqueio informativo, de voz única, a que estamos sujeitos.
O EUA DEVEM AO MUNDO UMA RESPOSTA SOBRE OS BIO-LABORATÓRIOS
Global Times
O Ministério da Defesa da Rússia divulgou na quinta-feira [10 de março] documentos que adquiriu do pessoal de um laboratório biológico na Ucrânia. Os documentos expõem as pesquisas dos EUA e seus aliados da NATO sobre armas biológicas na Ucrânia, incluindo pesquisas sobre a disseminação do vírus da gripe aviária, altamente infeccioso, através de aves migratórias e sobre patógenos como bactérias e vírus que podem ser transmitidos de morcegos para humanos. A Rússia disse que os documentos mostram a existência de um grande número de amostras de soro pertencentes a [população] eslava e que as experiências na Ucrânia são semelhantes às que a Unidade 731 do Japão fez na Segunda Guerra Mundial. Os documentos foram colocados online pela Rússia para download gratuito.
A reacção dos EUA errou o alvo. A secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, fez oito tweets consecutivos para condenar a Rússia por espalhar desinformação, mas evitou falar sobre os laboratórios biológicos dos EUA na Ucrânia. E afirmou que “todos devemos estar atentos para a possibilidade de a Rússia usar armas químicas ou biológicas na Ucrânia”. Mas não apresentou nenhuma prova. Tal condenação não ajudou a esclarecer as dúvidas das pessoas ao redor do mundo. Em vez disso, tal resposta é deslavada e ilógica.
No entanto, a subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland, confirmou durante uma audiência que a Ucrânia possui “instalações de pesquisa biológica” quando lhe perguntaram se a Ucrânia possui armas biológicas. E disse também que os EUA estão a trabalhar com a Ucrânia para impedir que a Rússia obtenha “esses materiais de pesquisa”.
Estas observações contraditórias aprofundaram ainda mais as dúvidas do mundo sobre os EUA. Os EUA têm laboratórios biológicos na Ucrânia? Porque é que os laboratórios se apressaram a destruir os materiais logo após o início do conflito Rússia-Ucrânia em 24 de fevereiro? Esses laboratórios estão envolvidos em pesquisas científicas ou estão a criar armas com os resultados da pesquisa? Qual é a relação entre o Pentágono e os 336 laboratórios biológicos dos EUA em todo o mundo? Como é que os EUA garantem a segurança desses laboratórios? Porque são os EUA o único país a bloquear o estabelecimento do mecanismo de verificação da Convenção de Armas Biológicas há mais de 20 anos? O que preocupa os EUA? Qual é exactamente a ligação entre o laboratório de Fort Detrick [EUA] e a pandemia de COVID-19?
As actividades militares biológicas não são triviais. É razoável e legítimo que a comunidade internacional questione os EUA por isso. Logo após a Segunda Guerra Mundial, os EUA gastaram 250 mil ienes (vários milhares de dólares americanos na época) para adquirir [ao Japão] os dados da infame Unidade 731, mas nunca disseram para que eram usados os dados. Em quase 30 anos, o número de laboratórios P4 [os de mais alto risco] em solo americano aumentou 750% — acompanhado por um risco crescente de fuga de vírus. Por causa dos protestos internos, os EUA optaram por estabelecer laboratórios no exterior. Ao longo dos anos, no entanto, houve fugas mortais ligadas a laboratórios biológicos militares dos EUA na Ucrânia, Coreia do Sul, Cazaquistão e Geórgia. Mas os protestos furiosos nesses países foram simplesmente esmagados pela manipulação da opinião pública pelos EUA.
As armas biológicas são vistas como armas de destruição em massa, tal com as armas nucleares e químicas. Qualquer suspeita de desenvolvimento de armas biológicas deve ser prontamente investigada. A divulgação de informações pela Rússia foi muito específica e deve chamar a atenção da comunidade internacional. A veracidade desses materiais deve ser determinada por uma equipa de inspecção multi-partes liderada por uma organização internacional com autoridade, e não apenas pelos EUA. Os EUA devem saber que manchar os outros não os pode branquear a si próprios. Se estão realmente inocentes como afirmam, devem aproveitar para publicar o que é verdade e aceitar investigações multi-partes para provar a sua inocência.
Deve-se notar que esta foi uma descoberta acidental no conflito Rússia-Ucrânia, que não tem nada a ver com o conflito em si. A determinação dos méritos deste incidente não deve estar ligada à posição sobre a questão Rússia-Ucrânia. A comunidade internacional, incluindo a Europa, deve pressionar fortemente os EUA e não se deixar influenciar pelas alegações de desinformação de Washington. Os EUA devem ao mundo uma resposta sobre este assunto.